Radio Aleph
Radio Aleph
A conversation with Eduardo Lalo | Uma conversa com Eduardo Lalo
0:00
-1:08:02

A conversation with Eduardo Lalo | Uma conversa com Eduardo Lalo

Eduardo Lalo at Café con Cé, in San Juan, Puerto Rico

→ Press play to listen to my conversation with Puerto Rican writer Eduardo Lalo.

→ Aperte o play para escutar a minha conversa com o escritor porto-riquenho Eduardo Lalo (em inglês).

The newsletter can be read in English or Portuguese. For the Portuguese version, scroll down. 
A newsletter pode ser lida em inglês ou português. Para a versão em português, arraste para baixo.

English Version

In October, the pandemic forced me to spend my post-PhD-completion one-week vacation in Puerto Rico. Without being able to renew my visa in Brazil, I could only travel within the United States (and Puerto Rico is an unincorporated territory of this country). I’m glad things worked out that way. San Juan, Puerto Rico’s capital, made me feel at home - I spent my vacation in Latin America, just like I wanted. 

I always read books by local authors when I travel, and that is how I discovered the work of Eduardo Lalo (who considers himself Puerto Rican but was actually born in Cuba). Upon booking my ticket, I found his book “Simone”, which I read in a couple of days. I am the type of reader who falls in love with books. This happened when I read “The Unbearable Lightness of Being”, by Milan Kundera, at 16; “The Passion According to G.H.”, by Clarice Lispector, at 20; “The Catcher in the Rye”, by J.D. Salinger, at 28; “A Wild Sheep Chase”, by Haruki Murakami, at 30; “Divorce in Buda”, by Sándor Márai, at 32; and now, “Simone”, by Eduardo Lalo, at 36. Interestingly, the act of falling in love with a book always brings some consequential outcome to my personal life. This process forces me to look at myself with different eyes, leading me to make decisions that should have been made before. 

I met Lalo at a coffee shop in San Juan, which means you will hear some background noise in the audio above. In our conversation, he says that reading is the most intimate experience one can have. Even the rare intimacy we can have with another person, he says, is not as intimate as the one we experience when we read. “Because we are literally within ourselves. (...) The moment of reading is dramatically alive, especially when you have a passionate reading of a text”, he continues.  

“Simone” tells the story of a self-educated Chinese immigrant student (Li Shao) stalking a disillusioned, unnamed writer and professor. Shao courts the narrator by sending him anonymous and instigating messages. The whole novel is a notebook - what we read is what the character writes in his notebook. As such, we read many entries about the narrator’s relationship with San Juan, where he, as a writer, feels invisible (as does Shao, being a Chinese immigrant in Puerto Rico). Lalo writes a lot about invisibility in this book and others, such as “Intemperie” and “Los Países Invisibles”. 

Invisibility is the condition of most of humanity. (...) I remember an American girlfriend I had who told me her favorite music was reggae. I said that’s great, that’s from the Caribbean, it’s from Jamaica. That was news for her. She didn’t know that reggae came from Jamaica, and neither did she know that in Brazil people don’t speak Spanish. You have a country with 200 million [habitants] and enormous influence in the world and people don’t see it, whereas you have an idea of Switzerland (even if it is fictitious) with the Alps, chocolate, watches, and blond people. Visibility and invisibility are mechanisms of domination.  

In “Intemperie”, Lalo writes that he seeks a life outside of the structures of domination. I asked him if it is possible to experience such a life. His response is below:

Can you live outside the structures of domination? No, but that’s a form of provocation. In a way, you can (...). I am sure that (...) you are taught world history as the history of Europe. There are no women. No Africans, no people from Oceania, no Latin Americans, no pre-Colombian Indians. And we are accustomed to validate tremendously some of those cultural productions and ignore completely other productions. So in terms of writing, which is what I mainly know, I can live outside of that domination in terms of what are my admirations. I don’t admire or feel that I have to force myself that I have to be up to date in what (...) some cultural centers of the world, such as London, Paris or New York, are doing.

In this world of invisibility, Lalo thinks that what is perceived as Puerto Rican is only what comes from the United States. “Everybody knows Jennifer Lopez. She is Puerto Rican, but she was born and raised in the United States”, he says. As an unincorporated territory of the United States, Puerto Rico is in a sort of political limbo, since it is not formally represented in Congress. Similarly, Puerto Ricans cannot vote in the electoral college for president. In 2020, they voted in a referendum that asked whether their country should become a U.S. state. Approximately 52% of them voted yes. So far, Puerto Rico remains an unincorporated territory. To Lalo, “Puerto Ricans don’t have an identity problem; they have a political problem”.

As to suggestions about politics and fiction, Lalo recommends the series “Babylon Berlin”, on Netflix. The show is set in Berlin during the last years of the Weimar Republic. I started watching it the day before yesterday and have enjoyed it so far.

Versão em Português

Em outubro, a pandemia me forçou a passar as minhas férias pós-término-do-doutorado de uma semana em Porto Rico. Sem poder ir até ao Brasil para renovar meu visto, só pude viajar dentro dos Estados Unidos (e Porto Rico é um território não-incorporado deste país). Ainda bem que as coisas aconteceram assim. San Juan, a capital de Porto Rico, fez com que eu me sentisse em casa - passei as minhas férias na América Latina, exatamente como queria. 

Sempre leio livros de autores locais quando viajo, e foi assim que descobri o trabalho de Eduardo Lalo (que se considera porto-riquenho, mas na verdade nasceu em Cuba). Depois de comprar as passagens, deparei-me com o livro “Simone”, que li em alguns dias. Eu sou o tipo de leitora que se apaixona por livros. Isso aconteceu quando li “A Insustentável Leveza do Ser”, de Milan Kundera, aos 16; “A Paixão Segundo G.H.”, de Clarice Lispector, aos 20; “O Apanhador no Campo de Centeio”, de J.D. Salinger, aos 28; “Cançando Carneiros”, de Haruki Murakami, aos 30; “Divórcio em Buda”, de Sándor Márai, aos 32; e agora, “Simone”, de Eduardo Lalo, aos 36. Curiosamente, o ato de me apaixonar por um livro sempre culmina em alguma mudança importante na minha vida pessoal. Esse processo me força a olhar para mim mesma com outros olhos, levando-me a tomar decisões que já deveriam ter sido tomadas. 

Encontrei com Lalo em um café em San Juan, o que significa que você ouvirá barulho de fundo no áudio acima. Na conversa, ele diz que a leitura é a experiência mais íntima que podemos ter. Mesmo a intimidade rara que compartilhamos com outra pessoa, ele fala, não é tão íntima quanto a que temos quando lemos. “Porque estamos literalmente dentro de nós mesmos. (...) O momento de leitura é dramaticamente vivo, especialmente quando se tem uma leitura apaixonada de um livro”, ele continua.

“Simone” conta a história de uma imigrante chinesa autodidata (Li Shao) que persegue um escritor e professor anônimo e desiludido. Shao corteja o narrador mandando mensagens anônimas e instigantes. O romance inteiro é um caderno de anotações - o que lemos é o que o narrador escreve em seu caderno. Assim, lemos muitas linhas sobre a relação do narrador com San Juan, onde ele, como escritor, sente-se invisível (Chao também se sente assim como imigrante chinesa em Porto Rico). Lalo escreve bastante sobre a condição de invisibilidade neste e em outros livros, como “Intemperie” e “Los Países Invisibles”. 

A maior parte dos seres humanos está em condição de invisibilidade. (...) Lembro que tive uma namorada norte-americana cujo tipo de música favorito era o reggae. Eu disse, que ótimo, o reggae é caribenho, vem da Jamaica. Isso foi novidade para ela. Ela não sabia que o reggae vem da Jamaica, como não sabia que no Brasil não se fala espanhol. Você tem um país com 200 milhões de habitantes e influência enorme no mundo e as pessoas não o enxergam, enquanto têm uma ideia da Suíça (ainda que fictícia) com os Alpes, chocolate, relógios e pessoas loiras. A invisibilidade e a visibilidade são mecanismos de dominação.

Em “Intemperie”, Lalo escreve que ele busca uma vida fora das estrutura de dominação. Perguntei a ele se é possível viver tal vida. A resposta dele foi a seguinte:

É possível viver fora das estruturas de dominação? Não, mas essa é uma forma de provocação. De algum modo, é possível. Tenho certeza de que você aprendeu a história do mundo como uma história da Europa. Não há mulheres. Não há africanos, ninguém da Oceania, nenhum latino americano, ou índio pré-colombiano. E estamos acostumados a validar essas produções culturais tremendamente e a ignorar completamente outras. Então, em termos da escrita, que é o que conheço, consigo viver fora das estruturas de dominação ao escolher quem eu admiro. Eu não admiro ou me sinto obrigado a acompanhar o que (...) alguns centros culturais do mundo, como Londres, Paris, ou Nova York, fazem. 

Em um mundo de invisibilidade, Lalo acha que o que é entendido como porto-riquenho é apenas o que vem dos Estados Unidos. “Todo mundo conhece a Jennifer Lopez. Ela é porto-riquenha, mas nasceu e foi criada nos EUA”, diz. Como território não-incorporado dos Estados Unido, Porto Rico está em uma espécie de limbo político, já que o país não é representado no Congresso norte-americano. Os porto-riquenhos também não podem votar no colégio eleitoral para presidente. Em 2020, eles votaram em um referendo que perguntou se o país deveria ser incorporado aos EUA como estado. Aproximadamente 52% deles disseram que sim. Até agora, o país permence como território não-incorporado. Para Lalo, “Porto Rico não tem um problema de identidade, mas sim um problema político”.

Sobre a relação entre política e ficção, Lalo recomenda a série “Babylon Berlin”, na Netflix, que se passa em Berlin durante os últimos anos da República de Weimar. Comecei a ver anteontem e estou adorando.

Essa newsletter é produzida em parceria com o Espaço Rasgo, uma casa de cultura que promove a arte, o conhecimento, e o debate.

0 Comments
Radio Aleph
Radio Aleph
Radio Aleph é um podcast sobre política e ficção apresentado por Beatriz Rey e produzido por Rafael de Angelis. Radio Aleph is a podcast about politics and fiction hosted by Beatriz Rey and produced by Rafael de Angelis.
Radio Aleph is a podca